sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

ARTIGO - De Advogada a Ré

Artigo publicado hoje, 17 de fevereiro, no jornal Diário do Grande ABC, de autoria do prof. Vander Ferreira de Andrade. Advogado criminalista. Especialista, Mestre e Doutor em Direito pela PUC-SP. Professor de Direito Penal e Coordenador do Curso de Direito da Universidade Municipal de São Caetano do Sul - USCS


De advogada a Ré
O furor midiático que envolveu o julgamento de Lindemberg Alves Fernandes deixou mais vítimas do que se imaginava em princípio. Além daquelas pessoas atingidas direta ou indiretamente pelo ato insano do rapaz que não concordava com a separação decidida pela namorada, também sai chamuscada deste episódio a advogada de defesa, Ana Lúcia Assad. Não se está aqui a dizer ou sustentar que o acusado não cometeu o crime a que está sendo atribuída sua responsabilidade. Ao contrário, as provas parecem caminhar na direção de seu inevitável envolvimento com o fatídico desfecho: a morte de uma jovem e linda adolescente.

Mas o que se pode depreender desse teatral cenário revestido da solenidade do Tribunal do Júri? Afinal, o que faz uma advogada, uma profissional especializada que é chamada para operar, num dos momentos mais cruciais da vida de um acusado para fazer uma defesa, numa situação dentro de um contexto aparentemente impossível? Um caso perdido diriam alguns. Outros falariam, não há qualquer chance ou possibilidade para a defesa. Outros afirmariam que, nesse caso, em especial, o julgamento é apenas uma mera formalidade, daquelas que precisam ser realizadas para que se “cumpra a tabela”, afinal, “alia jacta est”.

O veredito de há muito já foi lançado, e a sorte, não parece sorrir em nenhum momento para Lindemberg; ao contrário, a Deusa Têmis, aquela que representa a Justiça, com seus olhos vendados e o seu sorriso oculto (irônico, possivelmente), começa a levantar e analisar a responsabilidade do acusado através da balança que segura em uma de suas mãos, enquanto na outra, brada a espada, para logo em seguida decepar as mais remotas esperanças de liberdade para o réu.

O episódio remete para uma reflexão sobre a árdua e difícil profissão de defensor. Mais ainda, a de mulher advogada; mais ainda, a de criminalista. Numa situação de favas contadas, ela e o já julgado e condenado réu. Sim, julgado e condenado, e por larga antecipação, afinal, as imagens repetidas e reiteradas das inúmeras cenas gravadas à época, seguidas e acompanhadas dos comentários dos especialistas de plantão (eu diria, de oportunidade), presentes aos múltiplos e diversos programas jornalísticos e televisivos, certamente já influenciaram os jurados, pessoas comuns, simples e leigas, extraídas através do lançar dos dados do seio da sociedade, e certamente já predispostas a decidir de forma a tornar efetiva e cortante a espada de Têmis.

Não é saudável que o profissional continue a receber das vozes anônimas das ruas, a pecha de “defensora de assassinos”, que precise ser escoltada por policiais para poder se locomover como uma cidadã; uma profissional, que numa das horas mais negras de nossas vidas pessoais, pode vir a ser a única pessoa que tenha a capacidade técnica, vontade e o desejo de nos defender das garras e da voracidade de um Estado poderoso, arrogante e plenipotenciário.


http://www.uscs.edu.br/publico/mensagens/index.php?F=487d4c6a324446b3fa45b30cfcee5337.2012.1&idf=487d4c6a324446b3fa45b30cfcee5337&idi=1&ida=2012&

Nenhum comentário:

Postar um comentário