Entrevista publicada no site www.ciasbrasil.com.br
Dóris Wilhelm: pronta para novo desafio
Por Cleber Cabral Reis
Da Agência CiasBrasil de Notícias
09/01/2012
Portal - Qual foi o motivo da sua mudança depois de quatro anos na Paranapanema?
Dóris - Nos mais de quatro anos como diretora de Relações com Investidores da Paranapanema tive a oportunidade de estruturar uma área de RI, praticamente inexistente, quando ingressei na empresa em outubro de 2007. Foi uma experiência muito rica. Fizemos várias operações e transações no mercado de capitais, visando às reestruturações financeira, tributária e societária; a preparação da empresa para a adoção das normas contábeis internacionais (IFRS) e migração para o Nível 1 do Novo Mercado da BM&FBovespa. Acho que o fato da Paranapanema ter conquistado, no ano passado, o Prêmio IBGEC de Governança Corporativa, coroou o trabalho realizado pela equipe que comandei nesses últimos anos.
Portanto, somada a sensação de missão cumprida e fechamento de um ciclo na Paranapanema, houve uma dupla coincidência que terminou conciliando interesses: um projeto pessoal - voltar à minha terra natal, o Rio Grande do Sul, com o objetivo de ficar mais próxima dos meus pais, depois de 25 anos residindo em São Paulo; e,um novo projeto profissional - que envolve a liderança em projetos no mercado de capitais e em RI, que são meus propulsores profissionais.
Portal - Das experiências que você teve na Paranapanema, qual foi a mais marcante?
Dóris - Foi o conjunto da obra. No entanto, o que de fato me marcou muito foi a liquidação das debêntures conversíveis em ações ordinárias em apenas cinco meses, uma vez que o prazo de vencimento da 1ª série era de 30 meses e o da 2ª série de 11 anos. Eu brinco que podíamos ter ido para o Guiness. A emissão foi autorizada em AGE em 13 de junho de 2008 e a liquidação financeira de 100% da emissão ocorreu em 13 de novembro do mesmo ano. Houve uma verdadeira operação de guerra para liquidação, pois uma das fontes de recursos para a liquidação da dívida (das debêntures conversíveis) era a alienação de parte dos ativos da empresa e a subsidiária integral da Paranapanema, a Taboca-Mamoré, que havia sido vendida para o grupo peruano Minsur e cujas ações estavam dadas em garantia real aos debenturistas por escritura pública.
Conclusão: no dia 13 de novembro de 2008 reunimos mais de 50 pessoas envolvidas na operação para a liquidação das debêntures e venda da Taboca. Havia representantes da Paranapanema, da Minsur, representantes dos debenturistas, dos fundos de pensão e dos acionistas, do agente fiduciário, do banco depositário e custodiante e advogados de todas as partes. Na mesma ora, recebemos o cheque da venda dos negócios no setor de estanho Taboca, pagamos os 50% da dívida restante com os debenturistas, o que gerou a obrigatoriedade de conversão dos 50% restantes da dívida em ações ordinárias (conforme previsto no Acordo de Reestruturação), zerando a dívida. O agente fiduciário deu o de acordosobre a liquidação das debêntures, o banco custodiante liquidou e converteu no sistemaescritural de ações e foi dada baixa do gravame nos livros da Taboca, das ações dadas em garantia na escritura, com a transferência de titularidade para a empresa compradora da Taboca. Foi uma operação muito bonita, somada ao fato de que naquele momento - setembrode 2008 - o mundo financeiro desabava com a quebra do Lehman Brothers. Felizmente, tudo acabou muito bem!
Portal - Quais os desafios que espera encontrar na Forjas Taurus?
Dóris - O grande desafio será aprender sobre um novo setor, sua lógica e sua dinâmica; entender a cultura da empresa, seus pontos fortes e fraco; as oportunidades e as ameaças; a transição para um aprofundamento da governança corporativa da empresa com a ida para o Nível 2 do Novo Mercado;e, a formação de um conselho independente. E, em meio a este caldeirão de informações, elaborar uma estratégia de RI, de comunicação e de construção de um relacionamento com o mercado, além de difundir internamente uma cultura de RI.
Portal - O fato da empresa vender armas não torna o desafio ainda maior?
Dóris - Em parte sim, pois é um setor que sempre provoca uma certa polêmica. A Taurus é uma marca mais conhecida pelo segmento de armas, embora o segmento de não-armas venha respondendo por uma participação crescente, hoje, de mais de 28% do faturamento das empresas do grupo.
O segmento de não-armas, compreende a produção e vendas de capacetes, bauletos e acessórios para motociclistas, forjaria, caldeiraria, coletes balísticos, escudos anti-tumulto e produtos plásticos, tais como contêineres de diversas dimensões utilizados em hospitais, hotéis, prefeituras, lavanderias, fruteiras, enfim, para o armazenamento de produtos e coleta e disposição de resíduos sólidos. Este é um mercado muito promissor, pois apenas em capacetes, há previsão de crescimento de 18% em 2012.
No segmento de armas, o mercado civil diminuiu muito nos últimos anos. Hoje a Taurus vende no mercado interno basicamente para as forças policiais, guardas municipais, empresas de segurança privadas e, em menor escala, para alguns segmentos específicos como os profissionais ligados à Justiça – advogados, juízes, promotores, oficiais de justiça. A Taurus também vem buscando o desenvolvimento de novos produtos, em especial na área de armas não-letais que tende a crescer de forma significativa na defesa pública, especialmente em função dos futuros eventos esportivos que o Brasil sediará. O mercado da segurança vem crescendo em todo o mundo, inclusive no Brasil, pois a sociedade exige cada vez mais do Estado a ampliação desses serviços.
Nas exportações, separamos em dois grandes mercados, um grupo de mais de 70 países, para os quais vendemos armas para defesa pública e privada e o mercado dos EUA, onde predomina o uso de armas para a defesa pessoal e para caça, que fazem parte da cultura americana, além, é claro, da segurança pública.
O desafio é buscar fundamentos positivos para a Taurus, que gerem múltiplos comparáveis competitivos com as demais opções de investimento disponíveis no mercado local e internacional.
Portal - Em maio deste ano, a Taurus aderiu ao Nível-2 de governança corporativa da BM&Fbovespa. Isso significa que a companhia terá que adotar outras práticas de governança e de direitos adicionais para os acionistas minoritários.
Dóris - Este movimento mostra a maturidade das empresas e do mercado de capitais brasileiro. A governança corporativa no Brasil não deixa nada a desejar ao resto do mundo, e em especial aos países com tradição no mercado de capitais. Avançamos muito na legislação da CVM e da BM&FBovespa e principalmente na autorregulação, que envolveu entidades de classe que criaram seus próprios códigos e certificações, tais como ABRASCA, APIMEC, ANBIMA, IBGC, IBRI dentre as principais.
A reforma do Estatuto Social da Companhia, para adesão ao Nível 2 e a aprovação em Assembleia Geral de Acionistas, mostraram a nova rota da Companhia em busca de maior governança, começando pela criação de comitês estatutários de assessoria ao Conselho, que inclusive extrapolam as exigências legais, uma vez que não são obrigatórios. Devemos criar diferenciais que atraiam os investidores que prezam por mais governança corporativa.
Portal - Além disso, os papéis da empresa não tem grande liquidez no mercado. Como pretende tratar essa questão?
Dóris - Se observarmos os principais objetivos de um programa de RI, estarão listados com certeza no mínimo quatro: maximizar o valor do acionista; formar uma base acionária satisfatória; atuar no sentido de que as ações tenham um preço justo nas bolsas de valores; e, por fim, preservar a imagem institucional da companhia, através da divulgação de informações obrigatórias ou espontâneas, de forma consistente, equânime, abrangente e transparente.
Portanto, a criação de valor e a administração das expectativas dos agentes de mercado são as peças chaves de tudo. O investidor normalmente tem três formas de identificar valor: o Valor percebido (valorização das ações nas bolsas – ganho de capital); o Valor recebido (dividendos, bonificações, etc); e o Valor de troca (liquidez).
Inúmeras ações focadas nestes objetivos e utilizando as diversas ferramentas de RI podem facilmente melhorar a liquidez, desde a mudança na base acionária (targeting), à contratação de um Formador de Mercado, bem como a melhoria na governança corporativa Nível2, que já atrai inúmeros investidores, que antes tinham restrição em investir em companhias fora de um dos três níveis de GC da BM&FBovespa.
Portal - Você faz parte de um grupo seleto de mulheres que galgou a diretoria de RI de grandes empresas. Nesta sua trajetória quais foram as maiores barreiras que teve que superar?
Dóris - Eu diria barreiras normais que qualquer profissional enfrenta em seu dia-a-dia, até consolidar seu espaço na empresa e no mercado onde atua. No início de carreira, ser mulher em um universo eminentemente masculino, que sempre foi o mercado financeiro e de capitais, foi um grande desafio e aprendizado. Este fato, somado à experiência inicial de mais de 17 anos em bancos de investimento, extremamente competitivos, e mais 16 anos em empresas indústrias; muitas viagens internacionais e o fato de ter vivido dois anos fora do país, ajudaram no desenvolvimento da habilidade em lidar com a diversidade, com pressão, com prazos e metas apertados e com diferentes tamanhos de egos, com um público muito exigente que são os investidores, contribuindo para que eu gerasse dois ativos que julgo importantes na minha carreira: credibilidade e a busca constante pelo conhecimento. Em última análise, não importa qual é o seu sexo, e sim a sua postura perante a vida.
Portal - A presença feminina deve aumentar neste segmento nos próximos anos?
Dóris - Sim! Pesquisas a cada dois anos são realizadas pelo IBRI em parceria com a FIPECAFI USP, e a última foi divulgada em julho do ano passado, mostrando uma evolução muito positiva. Em 2003, apenas 32% dos profissionais de RI eram mulheres no mercado, passando para 39% em 2010. Infelizmente, este número já foi maior, uma vez que já atingiu 44% em 2008. Provavelmente, a crise financeira global a contar de setembro de 2008, provocou esta redução dois anos depois. Acredito que a presença feminina deve continuar aumentando, pois a mulher, por natureza é multi-focada, e a área de RI demanda uma visão mais sistêmica e multi-disciplinar.
Portal - Aliás, a profissão de RI mudou muito. O que as empresas e o mercado esperam de um profissional desta área?
Dóris - RI é um profissional que precisa ser multimídia. Como atividade estratégica de marketing corporativo, exige a combinação de disciplinas de comunicação e finanças. Nós lidamos com um público muito especializado e sofisticado formado pelos investidores, pelos controladores e grandes acionistas e também, por outras partes intessadas, os chamados stakeholders. Assim, o profissional de RI precisa conhecer profundamente a empresa, dominar todas as etapas da análise fundamentalista, a parte macroeconômica, setorial, a empresa, seu balanço, seus números, seus concorrentes, além de reunir capacidade de diálogo e de comunicação pessoal.
Portal - Mudando de assunto. Você está otimista com as perspectivas para a economia brasileira em 2012? Acha possível um crescimento de 4% como projeta o governo?
Dóris - Sim, porém moderadamente otimista, com possibilidade de um PIB crescendo um pouco abaixo dos 4% previstos pelo Governo. As incertezas geradas pela economia internacional e a consequente volatilidade afetaram a economia brasileira pelos canais do câmbio e do comércio exterior, com impacto especialmente na indústria, que responde em torno de 25% do PIB e que vem apresentando redução no ritmo de crescimento nos últimos trimestres. O segmento de serviços e o setor agrícola não sofreram tanto com a valorização do Real. Em termos conjunturais, os fundamentos da economia são positivos, com algumas ações de estímulo ao consumo e ao crédito, cortes nos impostos e possível redução nos juros, investimentos em infraestrutura, pré-sal e eventos esportivos, porém com o Governo mantendo a intenção de superávit primário e combate à inflação. Penso que o fator decisivo será o tamanho da desaceleração dos países emergentes, em especial da China, que poderá afetar o preço das commodities e uma solução para a zona do Euro, uma vez que as perspectivas para os EUA estão ficando menos pessimistas. O que preocupa, são os problemas estruturais do Brasil, que tendem a afetar nosso desempenho no longo prazo, tais como uma política industrial, a escassez de poupança, a qualidade da educação gerando gap de mão-de-obra qualificada, a reforma tributária e os investimentos corretos em infraestrutura.
Portal - Você acha que a Bolsa pode se recuperar no próximo ano?
Dóris - Com certeza sim, em especial se os juros baixarem e os fundamentos macroeconômicos e os fundamentos das companhias permanecerem positivos. Além disto, ainda há uma relativa liquidez, tanto no mercado local quanto internacional. O Brasil tem excelentes companhias de capital aberto com elevada rentabilidade em vários setores, com múltiplos comparáveis atrativos em relação aos seus pares internacionais, afetados pela crise global. Somado a isto, o mercado de capitais brasileiro deverá retomar o número de emissões (IPOs), pois há inúmeras operações represadas para entrar no mercado, apenas aguardando uma sinalização de melhora nos mercados.
segunda-feira, 9 de janeiro de 2012
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